Couvert: se não for pedido, não deve ser cobrado na conta

Inclusão do valor da entrada servida sem que o consumidor tenha solicitado é indevida, diz a Proteste

RIO — Você chega a um restaurante e o garçom, sem perguntar nada, deixa uma cestinha de pães e outros petiscos na sua mesa, enquanto espera você fazer o seu pedido. Essa cena, tão comum, pode configurar uma cortesia do restaurante ou uma prática abusiva, que fere o Código de Defesa do Consumidor (CDC). Tudo depende do que vier cobrado na conta, alerta a Proteste Associação de Consumidores. Segundo a entidade, se a pessoa não tiver pedido o couvert e se o garçom não tiver informado que há cobrança sobre ele antes de colocar na mesa algo que o cliente não solicitou, este deve ser considerado uma “amostra grátis ou cortesia”, de acordo com o Código de Defesa do Consumidor e, portanto, não deve gerar cobrança, ainda que tenha sido consumido.

Em fevereiro, pesquisadores da entidade foram a dez restaurantes da cidade do Rio de Janeiro, de forma anônima, para avaliar o serviço prestado pelos estabelecimentos quanto ao fornecimento de couvert a seus clientes. Os estabelecimentos foram escolhidos de forma aleatória procurando contemplar bairros diferentes. Foram eles: Albamar, no Centro; Amadeus, no Recreio; Aprazível, em Santa Tereza; Café Lamas, no Flamengo; Duo Restaurante, na Barra da Tijuca; Esplanada Grill, em Ipanema; Frateli, na Barra; La Mole, na Tijuca; Pax Delícia, na Lagoa; e Zuka, no Leblon.

De acordo com Maria Inês Dolci, coordenadora institucional da Proteste, os problemas encontrados nos restaurantes que fizeram parte do estudo foram variados: desde o fornecimento e a cobrança do couvert sem solicitação prévia do consumidor até a ausência de descrição do item no cardápio, passando pelo atendimento indevido do garçom, que questionou apenas um dos integrantes da mesa se desejava receber os petiscos. Notaram ainda que há restaurantes em que a cobrança do couvert é feita por pessoa e outros em que se cobra um único valor, independente do número de pessoas à mesa. Nos restaurantes em que a cobrança do couvert for por pessoa, o correto é o garçom perguntar a cada um dos integrantes da mesa se deseja a entrada, para não cobrar de quem não a consumiu.

O restaurante Esplanada Grill, em Ipanema, está agindo corretamente: o garçom, ao oferecer o couvert, informou que se tratava de um prato com cobrança individual e questionou se cada um dos integrantes da mesa o desejavam. Porém, no Albamar (Praça VX), Fratelli (Barra) e Zuka (Leblon), onde o couvert também é cobrado por cabeça, o garçom não questionou individualmente sobre quem desejava consumi-lo.

No Duo Restaurante, na Barra, o caso foi pior. O couvert foi posto na mesa pelo garçom sem qualquer questionamento sobre o desejo de os clientes consumi-lo e sem que ele informasse sobre a cobrança. Quando os pesquisadores reclamaram da cobrança de quatro couverts que não haviam sido solicitados, o Duo retirou a cobrança de apenas dois, alegando que os demais tinham sido consumidos.

No Aprazível, em Santa Teresa, apesar de o cardápio sinalizar que o couvert é para duas pessoas e a mesa servida ter quatro clientes, houve a cobrança correta por apenas um couvert, pois só foi pedida uma unidade.

Os pesquisadores verificaram que, entre os dez restaurantes visitados, apenas quatro — La Mole (Tijuca), Amadeus (Recreio), Aprazível e Fratelli — traziam a descrição completa do couvert no cardápio. Todos os demais — Albamar, Café Lamas, Duo Restaurante, Esplanada Grill, Pax Delícia e Zuka — não discriminavam os itens oferecidos na entrada.

— Além da descrição dos itens que compõe o couvert é imprescindível que o estabelecimento identifique em seu cardápio o tipo de cobrança que será feita pelo couvert oferecido, ou seja, se trata de um aperitivo individual, sendo cobrado por pessoa, ou família, sendo cobrado um valor único para toda a mesa — ressalta Maria Inês, acrescentando que, sempre que for consumir o couvert em um estabelecimento, a pessoa deve certificar-se do tipo de cobrança realizada para evitar surpresas ao pagar a conta.

Os representantes da Proteste avaliaram também se a quantidade servida para a mesa com quatro pessoas era comparativamente superior à quantidade servida para apenas uma pessoa, quando a cobrança era feita por cabeça. Os quatro estabelecimentos que detalham no cardápio os itens do couvert serviram o que foi proposto. Nos outros, não foi possível avaliar porque não havia descrição dos itens da entrada no cardápio.

Já em relação à quantidade, os restaurantes que realizaram cobrança por pessoa do couvert (Albamar, Duo, Esplanada Grill, Fratelli e Zuka) serviram porções maiores para a mesa com quatro pessoas do que o que foi servido para a mesa com uma pessoa, mas repuseram os itens à medida que estavam perto de acabar. Ainda assim, o que foi servido para quatro não era equivalente a quatro porções individuais.

Através da assessoria de imprensa, o restaurante Zuka informou que pratica a cobrança do couvert individual, o que está sinalizado de forma clara no cardápio da casa. Quanto ao couvert, este é composto por torradas e outros produtos que são trocados conforme a disponibilidade.

No caso do Café Lamas, o fato de a composição do couvert não estar discriminada nos cardápios nunca representou um problema junto aos clientes. De acordo com Milton Brito, sócio-proprietário do restaurante, os garçons se encarregam de especificar quais os produtos que serão servidos no couvert, o que nunca gerou críticas dos frequentadores do estabelecimento. Diante da ponderação feita no estudo pela Proteste, Brito já pensa em discriminar os itens do couvert quando elaborar novos cardápios do restaurante.

O Pax Delícia explicou que descrição dos itens que compõem o couvert não consta por conta de erro quando da impressão do cardápio e que está sendo anexado um informativo até a reimpressão dos mesmos. Além disso, a equipe é orientada a detalhar o conteúdo do couvert sempre que o mesmo for solicitado e/ou oferecido ao cliente. O restaurante informou ainda que os itens são definidos pela franqueadora e as trocas somente são realizadas ou autorizadas pela mesma. Por isso, não há substituição de itens com frequência nos restaurantes da rede.

O restaurante Duo informou que pratica a cobrança do couvert individual, o que está sinalizado de forma clara no cardápio da casa, e que este é preparado com produtos artesanais e de alta qualidade.

O restaurante Fratelli preferiu não comentar as conclusões do estudo da Proteste. Procurados pela reportagem, os representantes do Albamar e Esplanada Grill não retornaram até a publicação da matéria.

Por não concordar com a postura adotada por alguns restaurantes, a Proteste encaminhou os resultados do estudo ao Procon-RJ, solicitando a fiscalização e a punição dos estabelecimentos infratores.

— Precisamos de uma vez por todas de mais respeito ao consumidor nos restaurantes e bares, não apenas no Rio de Janeiro, mas em todo o país. Que sirva de exemplo e que os problemas sejam corrigidos — conclui a coordenadora da Proteste.

Fonte: O Globo


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